O interesse em marketing político e comunicação pública vem crescendo em todas as regiões do país.
Dois dos principais especialistas brasileiros em comunicação digital voltada para a política, Marcelo Vitorino e Fred Perillo são unânimes sobre a dificuldade em mensurar o quanto o uso das mídias digitais tem melhorado o contato entre agentes públicos e a população. Mas concordam ainda mais sobre ser este um caminho sem volta para quem participa da política.
Para Vitorino, a dificuldade em verificar se o contato entre eleitos e candidatos com os eleitores está mais forte ainda existe. “Até porque, boa parte deles não aprendeu a usar a Internet como poderia. Muitos usam as redes sociais de forma inadequada, publicando conteúdos que não agregam à comunicação, que não são informativos para a população. Como publicações que parabenizam aniversários de cidades ou então o dia de um profissional”, comenta. Segundo ele, essas ações não aproximam a população, são simplesmente publicações para cumprir tabela. “O agente público poderia colocar ali a explicação de um projeto de Lei, a motivação de uma destinação para uma emenda, o dia a dia, a sua agenda como parlamentar, por exemplo.”
Perillo vê limitação para medir isso, pois o que existe atualmente são rankings de influência digital de parlamentares federais. Mas além de só medir uma parte da classe política, na opinião dele estes artifícios “são furados porque a metodologia utilizada é superficial”. Não adianta pontuar um político porque ele tem um website se não houver uma análise da qualidade técnica da plataforma, se o conteúdo ofertado é bom. “Faltam no Brasil índices confiáveis de maturidade digital na área da política”, argumenta.
Formado em Direito, Vitorino acabou entrando na política pela militância, participando de atividades de juventude partidária, “fazendo campanha porta a porta, bandeiraço, campanha com segmentos”. Só depois migrou para a área digital. A prática forjou sua especialidade, levando a se tornar professor da renomada Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Jornalista, Perillo migrou das redações para o marketing digital em campanhas eleitorais. Dessa prática, passou a ser um dos principais especialistas no tema no Brasil.
Os resultados que ambos viram acontecer – com clientes e concorrentes – lhes dá a certeza de que o impulso da renovação política em andamento é baseado no uso das redes sociais. “É possível afirmar que, em alguns anos, os políticos que ainda fazem a política à moda antiga vão, cada vez mais, perder espaço. Não é que eles vão desaparecer, aí seria um exagero. Mas eles podem, sim, perder espaço para estes novatos, que têm mais domínio da comunicação como as pessoas têm hoje”, avalia Vitorino.
De acordo com Perillo, é possível afirmar que as mídias sociais são extremamente úteis e atualmente indispensáveis na divulgação das atividades parlamentares e na interatividade com a população. E a utilidade não é apenas para a classe política – que dispõe de canais (além das redes sociais, ferramentas como o whatsapp) de comunicação e interação – mas também para os cidadãos, que têm acesso direto aos parlamentares, algo praticamente impossível anos atrás. “Mesmo levando em consideração que muitos canais são geridos pela equipe e não pelo próprio político, ainda assim o acesso eleitor-político é mais facilitado. Utilizar a tecnologia para divulgar ações e interagir com a população, a meu ver, é um caminho sem volta”, assegura.
Perillo alerta que nas eleições de 2018 houve uma hipervalorização do digital em alguns casos específicos. Muitos candidatos Brasil afora apostaram todas as fichas nas redes sociais e deixaram de fazer o dever de casa como participar de reuniões e atividades de rua. Mesmo com todo o avanço do digital, algumas coisas não mudarão tão cedo em campanhas políticas. “Quanto maior o centro urbano, maior a necessidade da mídia digital. Em cidades menores, no interior dos estados, o peso do digital é menor, mas nem por isso dispensável.” Vitorino concorda que nas regiões onde a Internet ainda não tem tanta chegada, a parte digital tem limitações. “Mas isso deve acabar conforme aumente o uso da Internet no país. Então, a tendência daqui para frente é ter cada vez menos políticos no ponto zero e cada vez mais políticos acostumados a se comunicar com o eleitor.”
Renovação
A velocidade com que a tecnologia entrou na vida das pessoas é impressionante. Na prática, ao menos duas gerações já convivem com smartphones e social media com a mesma naturalidade que os pais dos seus pais iam às urnas com o título de eleitor e as propostas que os candidatos apresentavam nos tradicionais “santinhos” de papel e faziam nos comícios. Será que esse avanço todo permite prever se haverá um aumento da renovação política? Para Vitorino isso é algo difícil de afirmar. “Até por que não houve tempo para maturação dos seus mandatos. A maioria acabou se elegendo pela primeira vez. Então leva aí um tempo de decantação para ver o que eles vão produzir.
Não é simplesmente se eleger. A gente precisa esperar um pouco antes de fazer uma previsão mais acertada”, explica. “Prever é algo muito complicado. O que eu posso dizer, e que é óbvio, é que novos canais digitais surgirão, novas redes sociais, novos mensageiros, plataformas de interação, e que todos terão algum tipo de utilidade na comunicação política. Inteligência de dados e outros tipos de tecnologias que monitoram o comportamento dos usuários também vão crescer exponencialmente”, afirma Perillo. As respostas dos dois especialistas deixam a entender que muito mais do que interação digital, os políticos precisam ter conteúdo de qualidade para continuarem merecendo os votos da população.
Mercado de trabalho
Não só a população e os políticos conheceram um mundo diferente com a digitalização das campanhas eleitorais. Se para o primeiro grupo é a oportunidade de ser ouvido por quem conduz o destino de todos e para o segundo é chance de aumentar a capacidade de divulgar seus atos, para os profissionais de comunicação essa realidade abriu um novo mercado de trabalho.
Fred Perillo atesta que o interesse por capacitação nas áreas de marketing político, eleitoral e comunicação pública é crescente e não se restringe a regiões específicas. “Eu ministro aulas no Sul e também nos estados mais distantes da Amazônia. Atribuo esse interesse a dois fatores. Em primeiro lugar, à deficiência curricular nos cursos de comunicação, que estão defasados em relação ao marketing político e à comunicação digital. Há algumas novidades em relação à pós-graduação e MBAs, mas no geral a graduação é deficiente. As escolas de comunicação continuam formando jornalistas e publicitários para redações que não existem mais”, defende.
O outro fator citado por ele é que este mercado de trabalho é crescente. “Hoje há um déficit de profissionais altamente capacitados para atender parlamentares e instituições públicas e governamentais no tocante ao marketing político e institucional digital. Por isso a grande procura por cursos de capacitação nessa área.”
Desde 2008, quando fez em São Paulo a campanha que elegeria Gilberto Kassab para a prefeitura da maior cidade do país, Marcelo Vitorino vem notando o aumento do interesse pela profissionalização desse mercado. Naquela época, conta ele, eram pouquíssimos profissionais capacitados para trabalhar com a comunicação digital e ainda hoje tem pouca gente preparada. “Quando se compara o tamanho do país, a quantidade de oportunidades que tem e o número de profissionais reconhecidamente bons é muito destoante, sem dúvida nenhuma. Temos 5.700 municípios. Só as cidades acima de 100 mil habitantes passam de 300. Então imagine que em uma eleição em cidades acima de 100 mil habitantes, em que a Internet tem um peso muito grande, você tenha cinco candidatos a prefeito. Nós estamos falando de 1500 candidaturas. Não existe no país este número de profissionais com este tipo de expertise”, comenta.
Formados em jornalismo, publicidade e marketing são os profissionais com ligação direta a esse admirável nicho novo de trabalho. Mas nada impede que trabalhadores de outras formações também possam se especializar. O que é essencial, sem dúvida, é conhecer bastante sobre política, tecnologia e comunicação. Sem conhecer esses três pilares, não se consegue fazer uma boa campanha. Uma característica final à esse cenário é apresentada por Vitorino, que tem notando um aumento muito grande de interesse na área por parte das mulheres. “Em breve, vamos ver muito mais a presença de profissionais mulheres, o que tem a ver também com o crescimento da participação feminina dentro da política”, conclui.