Cirurgia corrigiu má-formação congênita em um feto de 33 semanas, permitindo que a gestação continue normalmente.
O Hospital da Criança e Maternidade (HCM), de São José do Rio Preto, no interior paulista, realizou um procedimento inédito no planeta para corrigir uma má-formação congênita em um feto de 33 semanas, ainda dentro do útero, permitindo que a gestação continue normalmente.
O feto possuía gastrosquise, uma abertura nos músculos e na pele da parede abdominal que permite que o intestino fique para fora do abdômen. Até então, o paciente só havia sido operado logo após o nascimento.
Nesta segunda-feira 17 de Junho 2019, os médicos do HCM e de outras três instituições corrigiram a anomalia, semanas antes do nascimento. O procedimento, chamado, fetoscopia, foi realizado pelos médicos do Hospital da Criança e Maternidade, Hospital Albert Einstein, de São Paulo, Universidade de Taubaté e do Hospital de Baia Blanca, da Argentina.
Reconhecimento
O ineditismo fez com que a equipe recebesse um convite para apresentar o procedimento cirúrgico no Congresso Mundial de Medicina Fetal, que será realizado na Espanha. Só no Brasil, a cada 2.000 bebês, um nasce com essa má-formação congênita.
A equipe médica responsável pelo fato inédito foi integrada pelos especialistas em medicina fetal Gustavo Henrique de Oliveira, do Hospital da Criança e Maternidade, e Gregório Lorenzo Acácio, da Universidade de Taubaté, pelos cirurgiões Denise Lapa e Rodrigo Russo Gonçalves, do Hospital Albert Einstein, e pelo cirurgião argentino Javier Svetliza.
A cirurgiã fetal Denise Lapa, que desenvolveu a técnica de fetoscopia, ressaltou que o sucesso do feito é devido ao trabalho da equipe, motivada pelo impacto emocional da evolução médica para a paciente. “Poder pegar seu filho no colo no momento que ele nasce, poder amamentá-lo é extremamente importante, precioso para a mãe”, afirmou.
Os médicos precisaram de uma hora e 40 minutos para realizar esse procedimento, que se assemelha a uma laparoscopia, sendo minimamente invasivo. Eles fazem quatro pequenas incisões na barriga da mãe por onde introduzem os braços, instrumentos que lhes permitem ver o interior do útero e corrigir a má formação, introduzindo o intestino no abdômen do feto e fechando a parede abdominal.
Gustavo Henrique de Oliveira cita outros benefícios para a saúde e bem-estar do futuro bebê e da mãe. O primeiro é a segurança do procedimento. “O feto é operado no ambiente mais estéril possível, que é o útero materno, ao contrário da cirurgia convencional, feita após o nascimento, já exposto ao ambiente da sala cirúrgica. Com isso, o risco de infecção é extremamente reduzido”, explica o médico do HCM de São José do Rio Preto.
Vantagem
Outra grande vantagem é o fato de o bebê nascer sadio, o que permite mamar imediatamente no seio da mãe e ter alta hospitalar em dois ou três dias. Já a criança que se submete à cirurgia de correção da gastrosquise após o nascimento tem as alças intestinais muito inflamadas, o que a impede de mamar e precisa permanecer, em média, 30 dias internado, recebendo nutrição parenteral. Ela só terá o contato com o seio materno após esse período.
“Quando essa cirurgia é feita após o nascimento, o intestino já tem um dano inflamatório grande, muitas vezes nasce muito inchado e rígido e é mais difícil colocar para dentro. Por isso, o tempo de internação tão grande”, explica o especialista.
“Se corrige no útero, o intestino não sofre o processo inflamatório tão intenso e já está se acostumando”, completa. Como a cirurgiã Denise Lapa, seu colega argentino Javier Svetliza destaca o impacto emocional na mãe, o que repercute no estado de saúde.
“Ao saber que o seu futuro filho tem uma má-formação como essa, a mãe sofre muito. Poder corrigir este problema ainda no útero dá um alívio enorme para a gestante, mudando todo o estado emocional e a saúde para as últimas semanas de gravidez”, salienta.
Experiência
O Hospital da Criança e Maternidade de Rio Preto realiza já há cinco anos a gastroesquise convencional, tendo uma das equipes mais experientes do Brasil nesse procedimento. “Natural, portanto, que coubesse ao hospital a responsabilidade de fazer o primeiro procedimento do mundo. Todos estamos muito felizes porque se abre agora a possibilidade de beneficiarmos milhares de futuros bebês no País e no mundo”, avalia a cirurgiã Denise Lapa.
Com uma estrutura de oito andares, além de térreo e subsolo, com capacidade instalada para 180 leitos, o HCM ocupa uma área de 18 mil m2 e integra um dos maiores complexos hospitalares do Estado, que reúne o Hospital de Base de Rio Preto, o Ambulatório de Especialidades, o Instituto do Câncer, o Hemocentro de Rio Preto e a unidade do Instituto de Reabilitação Lucy Montoro.